Pela primeira vez na América Latina, pedaços de microplástico foram encontrados em placentas e cordões umbilicais de gestantes brasileiras. O achado inédito foi feito em Maceió (AL), capital que enfrenta graves desafios ambientais, e causou alerta na comunidade científica. O estudo, realizado por pesquisadores da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), em parceria com a University of Hawai’ at Mãno, foi publicado nesta sexta-feira (25), nos Anais da Academia Brasileira de Ciências.
Das dez amostras analisadas de gestantes atendidas exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), foram identificadas 229 partículas de microplástico. O dado mais alarmante, segundo os pesquisadores, é que 119 dessas partículas estavam nos cordões umbilicais, em oito das dez amostras analisadas — o que indica a travessia da barreira placentária pelas partículas e o consequente contato direto com o feto.
“Isso significa que há possibilidade de crianças estarem nascendo com plástico já presente em seus corpos”, alerta o biomédico Alexandre Urban Borbely, professor da UFAL e um dos autores do estudo. Segundo ele, a concentração nos cordões umbilicais supera a observada nas próprias placentas, o que aumenta a preocupação quanto aos impactos no desenvolvimento fetal e nas condições de saúde das crianças após o nascimento.
As análises laboratoriais identificaram que os microplásticos encontrados tinham menos de 5 milímetros e eram compostos principalmente por polietileno (muito usado em embalagens plásticas descartáveis) e poliamida (frequente em tecidos sintéticos). “Como a análise foi realizada em cerca de 40 gramas de tecido, estimamos que a quantidade real de partículas por órgão seja ainda maior”, afirma Borbely.
O estudo também aponta que o consumo de frutos do mar contaminados pode ser uma das vias de exposição, uma vez que os mares estão entre os principais vetores de poluição plástica. A equipe ressalta ainda a vulnerabilidade social e ambiental da população atendida pelo SUS, que frequentemente recorre à água mineral engarrafada, cujo transporte e armazenamento sob alta radiação solar favorecem a liberação de partículas do recipiente para a água.
De acordo com os pesquisadores, 75% do lixo nas praias de Maceió é composto por plásticos — com destaque para sacolas e embalagens de produtos ultraprocessados. A situação ambiental da capital alagoana reforça o alerta dos cientistas para a urgência de políticas públicas que combatam a poluição plástica e melhorem o saneamento e a qualidade da água consumida pela população.
O Portal Todo Segundo tenta contato com a Prefeitura de Maceió para comentar o impacto dos dados revelados pelo estudo.
Risco silencioso
A descoberta reforça preocupações globais com os efeitos dos microplásticos sobre a saúde humana. Apesar de serem invisíveis a olho nu, essas partículas vêm sendo associadas a processos inflamatórios, desequilíbrios hormonais e disfunções metabólicas em estudos laboratoriais. No caso dos fetos, os riscos são ainda mais desconhecidos — o que torna a descoberta em Maceió um marco científico e sanitário com repercussões potenciais para toda a América Latina.
“Estamos falando de um poluente invisível, que já chegou aos corpos mais vulneráveis da sociedade — fetos que ainda nem nasceram. Isso exige uma resposta urgente das autoridades e da sociedade civil”, finaliza Borbely.
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